Escuela de Ciencias Sociales y Humanidades, UNED, C.R.

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ISSN: 1409-4002 • e-ISSN: 2215-454X

O Estatuto Epistemológico da Pesquisa-Ação:
uma Releitura Realista Crítica*

Thiago Duarte Pimentel**

https://orcid.org/0000-0003-1889-069X

Recebido: 16 de outubro, 2018 • Aceito: 22 de novembro, 2018

Resumo

A literatura sobre pesquisa-ação/PA enfatiza seu papel, simultâneo, de produção de conhecimento e intervenção social. Todavia, duas críticas lhe têm sido tradicionalmente imputadas: (1) a de que não seria uma estratégia científica de produção do conhecimento, devido à falta de objetividade decorrente da indissociação valor-fato/teoria-prática; e (2) de sua incapacidade de gerar generalizações, já que o conhecimento produzido seria socialmente e subjetivamente contextualizado. Argumentamos, no entanto, com/e a partir do realismo crítico/RC, que tais problemas poderiam ser mitigados se parte dos elementos centrais daquela abordagem fossem ressituados e erigidos sobre as bases do RC. Este paper realiza, então, uma reflexão epistemológica acerca da PA, discutindo os principais obstáculos à disseminação e ao uso dessa estratégia, considerando: (1) seu estatuto epistemológico, (2) suas características distintivas e (3) sua capacidade de generalização. Como conclusão, apontamos alguns dos principais pontos pelos quais uma inflexão da PA via RC deveria passar, assim como algumas implicações dessa «atualização» paradigmática.

Palavras-chave: Ontologia, epistemologia, método de pesquisa, realismo crítico, pesquisa-ação.

* Originalmente, este trabajo fue redactado y presentado en el Congreso de la Asociación Latinoamericana de Sociología, en San José, Costa Rica (diciembre de 2015), y posteriormente en el Colóquio Internacional de Epistemologia e Sociologia da Ciência da Administração, en Florianópolis, Brasil (abril de 2017). Dichas versiones, a la época en construcción, fueran revisadas, ampliadas y sustancialmente modificadas hasta llegar a la versión actual, aunque la tesis central sea la misma.

** Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Mestre em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Bacharel em Turismo/UFMG. Professor e pesquisador de dedicação exclusiva na UFJF, na pós-graduação em Ciências Sociais (M/D) e em Administração (M), e também nos cursos de bacharelado em Ciências Humanas e de Turismo. Membro da Associação Internacional de Sociologia (ISA) e da Associação Internacional de Peritos Científicos em Turismo (AIEST). Professor visitante nos EUA, Canadá, México, Cuba, Equador. Líder da rede de pesquisa: Realismo Crítico, Ação Coletiva e Trabalho (REACT). Diretor do Centro de Excelência Latino Americano em Turismologia (CELAT) e do Observatório Económico e Social do Turismo (OEST). Editor Chefe das Revistas Anais Brasileiros de Estudos Turísticos (ABET) e Revista Latino Americana de Turismologia (RELAT). CV: http://lattes.cnpq.br/9841188234449467. Orcid Id: 0000-0003-1889-069X. Correo: thiago.pimentel@ich.ufjf.br

Formato de citación según APA

Pimentel, T. (2018). O Estatuto Epistemológico da Pesquisa-Ação: uma Releitura Realista Crítica. Revista Espiga, 18 (37), 66-98.

Formato de citación según Chicago-Deusto

Pimentel, Thiago D. «O Estatuto Epistemológico da Pesquisa-Ação: uma Releitura Realista Crítica». Revista Espiga 18, n.º 37 (Janeiro-junho, 2019): 66-98.

Introdução

Este paper realiza uma reflexão epistemológica acerca da estratégia metodológica Pesquisa-Ação (PA), ou Action Research (AR) em inglês, com vistas a discutir os principais obstáculos à disseminação e ao uso dessa estratégia, à validade do seu estatuto lógico-epistêmico bem como a contribuição que tal abordagem pode trazer para o estudo de objetos complexos e interdisciplinares –cada vez mais frequentes na ciência e sociedade contemporâneas.

Enquanto o primeiro obstáculo foi tratado sob a rubrica da clivagem entre teoria e prática, entre a produção de conhecimento (como um reflexo descritivo) da realidade e a intervenção na realidade tida como uma forma de ideologização «contaminadora» da ciência; o segundo problema foi tratado a partir dos cânones científicos do velho consenso ortodoxo1 e sua derivação metodológica (pesquisa quantitativa, survey e estatística descritiva), onde tal método (PA) não cumpria (e dificilmente poderia fazê-lo, já que parte de outra perspectiva de fazer ciência) os requisitos necessários para a produção de conhecimento científico. Daí decorre, então o terceiro problema (e, sua contraprova, decisiva, à tentativa de aspiração científica e legitimação pretendida pela PA): como verificar se esta forma alternativa de produção de conhecimento é legitima e válida se ela não é capaz de ser replicada?

Todas essas questões dominaram a literatura sobre PA, desde seu surgimento até os dias atuais, sem, contudo, encontrar uma solução à contento, provavelmente, devido ao fato de que as críticas ao positivismo em defesa deste método se reduziam a críticas externas àquele paradigma, sem que este nunca tivesse sido derrotado em seu próprio solo2. Uma vez esta condição tendo sido satisfeita pelo realismo crítico, um passo «natural» seria a reconsideração dos argumentos e proposições elencadas pela PA, situadas e recontextualizadas, a partir das premissas do realismo crítico. Dessa forma, desse hibridismo teórico genético uma possível solução seria o reestabelecimento da discussão da PA enquanto método científico, mas dessa vez, de forma mais bem fundamentada, a partir de uma aproximação maior à orientação realista, naturalista crítica, e ao mesmo tempo de um distanciamento do positivismo, avalizado em uma capacidade de crítica interna e externa a esta abordagem.

Destarte, o argumento desenvolvido aqui é o de que a PA, por meio de sua concepção de pesquisa e intervenção representa um primeiro passo rumo a uma alternativa original em relação ao paradigma positivista para o processo de pesquisa, porém, ainda suscetível aos vieses do relativismo «total» das abordagens antirrealistas e, portanto, frágil para sustentar uma sólida e perene elaboração científica. Nesse sentido, seu resgate e atualização, a partir de uma filosofia para a ciência realista crítica poderia suprir as deficiências epistêmicas originais daquela abordagem, conferindo-lhe maior rigor e cientificidade, dentro de um novo contexto de explicação científica.

Para isso, especificamente busca-se neste estudo resgatar a historicidade da pesquisa-ação, bem como uma tentativa de situá-la epistemologicamente dentre diferentes tradições filosóficas, evidenciando algumas implicações de utilização deste método –a partir das tradições em que ele se vincula– e, sobretudo; mostrando a potencialidade de sua utilização no que tange à problemática da especificidade do conhecimento científico relativo aos fenômenos sociais e organizacionais3: ou seja, produção do conhecimento concomitantemente a uma situação de mudança em que os diferentes elementos produtores deste conhecimento estão inseridos4, 5, 6, 7.

Uma premissa subjacente a este trabalho refere-se à legitimidade dos critérios de validade científica para além do mainstream, ou seja, fora da perspectiva das ciências naturais mas sem cair no seu oposto, isto é, situá-lo apenas dentro da perspectiva das ciências humanas, considerada a partir da especificidade da relação sujeito-objeto. Aqui se considera a legitimidade partir da própria ontologia da realidade social e de sua epistemologia própria, que não invalida à das ciências naturais, mas apenas reposiciona o debate acerca dos critérios de validade científica para a especificidade dos fenômenos sociais. Embora esta tese tenha sido advogada com bastante veemência pelas correntes irrealistas da filosofia da ciência, nossa defesa, no entanto, a situa dentro da perspectiva realista, mas não com base no realismo empírico ou ingênuo8, 9, mas sim em uma perspectiva realista crítica, que considerada a realidade a partir de estruturas reais transfactuais, podendo no entanto serem diferenciadas em razão do tipo de objeto (material, ideal, social ou artefatualmente) real10.

Assim, partindo da problemática de que a pesquisa-ação é uma forma de produção de conhecimento específica dos objetos socialmente reais por reconhecer e lidar com a «não homogeneidade através do tempo» destes fenômenos11, durante décadas este tipo de pesquisa tem sido deixado de lado pelo mainstream da filosofia da ciência por não se enquadrar nos moldes de produção de conhecimento estabelecido pelas ciências naturais. Duas principais críticas são feitas à pesquisa-ação: (1) que ela não seria uma estratégia científica de produção do conhecimento, uma vez que ela, ao misturar valores e fatos/teoria e prática, não possuiria o distanciamento ou a objetividade necessária para compreender e explicar cientificamente um dado fenômeno social; (2) por esse mesmo motivo não seria capaz de gerar leis científicas a respeito dos fenômenos estudados, que pudessem ser generalizadas para outros contextos 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24.

Além disso, no âmbito das ciências sociais, seu uso tem sido restrito a poucos pesquisadores, que, adicionalmente, estão orientados por tradições filosóficas distintas (25, 26, 27, 28), sendo aplicado tanto por pesquisadores de viés mais pragmático29, 30, 31, entre outros, onde a ênfase está no viés instrumental para solução de problemas; quanto por aqueles de viés crítico, como Kesby32, 33, entre outros34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, associados a uma vertente mais política com base em defesa de práticas sociais emancipadoras41. Vale ressaltar que enquanto estes últimos tendem a se concentrar em áreas diversas, indo da geografia humana e estudos populacionais42, passando pela educação43, serviço social44, à medicina45, 46; os pesquisadores de viés mais pragmático tendem a estar associados aos estudos organizacionais47 e aos problemas inerentes à temática organizacional48, sobretudo ligados à sociologia de pequenos grupos e empiricamente a temas como recursos humanos, mudança e desenvolvimento organizacional49, como se pode observar nos clássicos estudos de Lewin50 e do Tavistock Institute.

Segundo Cassell e Johnson52, uma vez que a pesquisa-ação tem sido muito usada para descrever e justificar as atividades organizacionais diversas, o seu emprego não pode ser visto como fruto da casualidade, mas sim da diversidade de fundações epistemológicas a partir das quais partem os pesquisadores. Todavia, a diversidade de domínios de origem dos estudos de pesquisa-ação parece não unificar as teorias, mas sim gerar mais fragmentação do campo com sua apropriação pelos pesquisadores em diferentes conotações53. Este uso do método51 por programas de pesquisa radicalmente diferentes corrobora para o estabelecimento da controvérsia, já que nenhuma destas abordagens consegue impor sua diferenciação e especificidade próprias daquela tradição, e por oposição invalidadas na outra. Essa disputa entre tradições filosóficas diferentes que reclamam para si a legitimidade em termos da fundação das bases da ‘verdadeira’ pesquisa-ação vem deixando-a mais suscetível às críticas de abordagens concorrentes e, principalmente, do mainstream, dificultando assim a sua assimilação e aplicação54. Assim, o fato de ser utilizado de forma simultânea e indistinta por pesquisadores pertencentes a paradigmas diferentes ainda reduz a credibilidade de tal abordagem.

O problema reside, então, no fato de que falta sedimentação e credibilidade científica desta estratégia de pesquisa, o que implica seu baixo uso pelos acadêmicos de diversas áreas. Além disso, muito pouco sobre construção de teoria vem da experiência com PA, o que reflete um ceticismo sobre a capacidade de teorização baseada neste método55.

Com base nestas questões, o principal argumento defendido neste texto é o de que a pesquisa-ação representa uma alternativa original em relação ao paradigma positivista para o processo de pesquisa. Porém, devido ao seu ponto de referência epistêmico de caráter indutivo-qualitativo, ainda é suscetível aos vieses do relativismo ‘total’ das abordagens antirrealistas e, portanto, frágil para sustentar uma sólida e perene elaboração científica. Tais problemas poderiam ser mitigados, se parte dos elementos centrais daquela abordagem forem (re)situados, de forma adequada e contextualizada, e erigidos sobre as bases do programa de pesquisa realista crítico56.

A delimitação de fronteiras mais claras e precisas entre a pesquisa-ação e outras estratégias de pesquisa contribuiria para melhor sedimentação e consolidação deste método particular de estudo dos fenômenos sociais57, levando assim, a um incremento na sua utilização e possivelmente a angariação de contribuições mais robustas no que tange à produção de conhecimento científico pari passo ao processo de intervenção na e mudança da realidade social (58, 59).

Tal movimento é fundamental para a consolidação de qualquer campo (60, 61, 62), inclusive o científico, onde os critérios de validade e legitimidade do que é (ou não é) cientifico têm sido tradicionalmente baseados na perspectiva dominante de origem nas ciências naturais, ou seja, com a clara distinção entre objeto observado e sujeito observador, o que permite o estabelecimento de critérios específicos de validade científica, como: a universalidade, a replicabilidade, a publicidade, a homogeneidade ao longo do tempo, etc.63.

Em síntese, a pretensa relevância deste estudo consiste no fato de propiciar uma aproximação propedêutica, à luz de um novo paradigma –o do realismo crítico– , que pode fornecer uma fundamentação mais robusta, sistemática e plausível acerca da PA –baseada na produção do conhecimento científico como identificação de tendências em sistemas abertos, ao invés da concepção tradicional de leis em sistemas fechados– o que cria um ambiente em que boa parte das críticas atribuídas a essa perspectiva perdem seu valor e outras merecem ser revistas, contribuindo assim para releitura original da PA a partir do realismo, ainda que de forma despretensiosa, como uma primeira aproximação em relação a uma compreensão mais sistemática acerca da pesquisa-ação à luz do realismo crítico.

O presente trabalho está estruturado em cinco partes. A primeira corresponde a esta introdução, que fornece um panorama sobre o artigo, sua natureza e objetivos. Na segunda seção apresento uma contextualização da especificidade dos problemas das ciências sociais, enfatizando a relação sujeito-objeto e a possibilidade de integração teórico-prática. Na terceira seção realizo um resgate histórico das origens, do desenvolvimento e dos principais obstáculos enfrentados pela pesquisa-ação ao longo das últimas décadas. Em seguida, na quarta parte, ofereço uma discussão sobre a natureza do conhecimento subjacente ao método de pesquisa-ação, focalizando o debate entre pragmatismo e o materialismo dialético (diamat) e as abordagens epistemológicas contemporâneas, em particular, o realismo crítico. Por fim, na quinta e última seção, são formuladas algumas questões a respeito das implicações da pesquisa-ação sobre a mudança social.

O Status de Cientificidade na Produção do Conhecimento segundo
o Mainstream e a Especificidade dos Fenômenos Sociais

O mito fundacional do conhecimento científico baseado na racionalidade, objetividade e universalidade predomina nas ciências naturais e humanas até os dias de hoje. Desenvolvido como uma extensão do pensamento filosófico abstrato para considerar a materialidade do mundo e da realidade concreta, o conhecimento científico esteve inicialmente baseado na observação da natureza, para sua compreensão, explicação e controle64.

Para Kerlinger65 a ciência, apoiada em evidências empíricas, teria o papel de superar as explicações metafísicas, absolutistas e mitológicas sobre o mundo, ou pelo menos de legitimar e suplementar estas explicações. A ciência teria uma preocupação exclusiva com o conhecimento e a compreensão dos fenômenos naturais (o que pressupõe a desconsideração dos fenômenos sociais, devido a sua alta variabilidade, ou sua redução ao entendimento como naturais), buscando sempre uma forma mais segura e precisa de entender e dominar a natureza, inscrita numa lógica de causalidade unidirecional: se fizermos isto, acontecerá aquilo.

Como um axioma fundamental desta maneira de pensar, o empreendimento científico consiste na objetividade, tida como a capacidade de se afastar de uma determinada ideia de tal modo como se ela estivesse fora do pesquisador, separada de seus juízos de valor. Ela seria representada por um «[...] acordo de juízes ‘especialistas’ relativo ao que é observado, ou o que deve ser ou o que foi feito em pesquisa66». Esse procedimento teria o papel de conduzir qualquer pessoa com alguma competência a encontrar os mesmos resultados de pesquisa, ou seja, eliminando-se os fatores pessoais e subjetivos de cada indivíduo alcançar-se-ia a objetividade.

Contudo, essa proposição implica uma série de processos pelos quais os pesquisadores devem passar, dentre as quais se destacam: a replicação dos resultados; o uso de testes e medidas para se ter maior precisão e objetividade sobre os fatos; gerando assim, uma sequência: procedimentos objetivados levam à replicação e por sua vez são validados. Outra implicação deste tipo de pensamento é o fato de se tomar um tipo de pesquisa (a das ciências naturais) como modelo referencial, podendo ser objetivada e mensurada, ao passo que a pesquisa social seria sempre «inferior» àquela no sentido de não conseguir alcançar tamanho grau de objetividade e precisão. Entretanto, as bases e os métodos do pensamento científico seriam os mesmos em ambas as situações, diferindo-se apenas com relação à teoria e aos resultados67.

Para Kerlinger68, do mesmo modo em que se apoia na objetividade, a ciência também se utiliza de seu caráter empírico para se ter evidências daquilo que se está observando. A preocupação com as evidências factuais seria, então, uma forma de dar suporte à argumentação «científica» desenvolvida sobre esses fatos. Nesse sentido, o caráter empírico da ciência (ou a evidência factual) viria legitimar o axioma: experiência empírica e observação levam à () teoria e explicação. Além disso, as evidências seriam o centro do processo científico, pois sem elas as conclusões não poderiam ser validadas (ou seja, não passariam de meras conjecturas). Como exemplo de não-ciências o autor cita a filosofia, a história e o pensamento político cujas teorias não se embasam em fatos ou podem se embasar em muitos deles, não obedecendo, portanto, a regra (causal) «se – então».

Assim, considerando-se a objetividade e o caráter empírico da ciência, tem se os dois pilares que fornecem a base para a construção do objetivo maior da ciência que seria o de formular uma teoria ou explicação sistemática e segura (comprovável) acerca do mundo. Porém, na tentativa de reproduzir o modelo de conhecimento científico das ciências naturais, as ciências culturais incorporaram uma série de regras, premissas e instrumentos, que com o passar do tempo se mostraram total ou parcialmente inadequados para a exploração dos fenômenos culturais. Dentre os principais obstáculos surgidos podem-se citar: a) a não separação física e objetiva entre sujeito cognoscente e objeto conhecido; b) a distinção requerida no modo de observação dos fenômenos sociais, e; c) geração do conhecimento científico durante o processo de mudança das situações sociais.

Um ponto de inflexão neste tipo de concepção científica foi elaborado por Weber69 ao tentar destacar a tênue linha que separa a ciência da crença, a partir do esforço de conhecimento científico dos fenômenos socioeconômicos. Para ele, a validade objetiva de todo saber empírico baseia-se na ordenação da realidade segundo categorias não subjetivas, que representam o pressuposto do nosso conhecimento e associam a verdade que só o conhecimento empírico pode proporcionar. Assim, «não existe nenhuma análise científica totalmente ‘objetivada’ da vida cultural ou [...] dos ‘fenômenos sociais’, que seja independente de determinadas perspectivas especiais e parciais [...]»٧٠.

A ciência social que ele defendia era a ciência da realidade. Porém, a visão weberiana da realidade visava entender o que ela tem de específica: de um lado, as conexões e significação cultural das manifestações sociais; e de outro as causas pelas quais ela se desenvolveu historicamente de uma forma e não de outra. Assim, nas ciências sociais o que interessa é o aspecto qualitativo dos fatos sociais, pois estas ciências se ocupam da intervenção de fenômenos espirituais (imateriais ou simbólicos), cuja «compreensão» por «re-actualização» constitui uma tarefa especificamente diferente da que poderiam resolver as fórmulas do conhecimento exato da natureza71.

Assim, Weber72 postula a peculiaridade decisiva das ciências da cultura, considerando o conceito de cultura como um conceito de valor. Para o autor, a realidade empírica é ‘cultura’ em virtude de sua relação, mais ou menos densa, com ideias de valor. A significação de um fenômeno cultural ou suas causas não poderiam ser deduzidas de qualquer sistema de conceitos de leis e nem explicados por ele, sendo a comprovação dessa significação que constitui a premissa para que algo se converta em objeto de análise:

«O número e a natureza das causas que determinam qualquer acontecimento individual são sempre infinitos e não existe nas próprias coisas critério algum que permita escolher dentre elas uma fração que possa entrar isoladamente em consideração. A tentativa de um conhecimento da realidade ‘livre de pressupostos’ só conseguiria produzir um caos de ‘juízos existenciais’ acerca de inúmeras concepções ou percepções particulares.»

Não se trata de saber a que fórmula se deve subordinar o fenômeno, mas sim a que constelação deve ser imputado como resultado. Onde quer que se trate de explicação causal de um fenômeno cultural, o conhecimento das leis da causalidade não poderá constituir o fim, mas apenas o meio da investigação. Nas ciências econômicas (e das organizações) não se trata de conexões regulares no sentido das ciências da natureza, mas de conexões causais adequadas, expressas em regras e, portanto, de uma aplicação da categoria de «possibilidade objetiva».

«Carece de razão de ser um estudo ‘objetivo’ dos acontecimentos culturais, no sentido de que o fim ideal do trabalho científico deverá consistir numa redução da realidade empírica a certas leis, não porque [...] os acontecimentos culturais ou, se quiser, os fenômenos espirituais, evoluam ‘objetivamente’ de modo menos sujeito a leis, mas: a) porque o conhecimento de leis sociais não é um conhecimento do socialmente real, mas unicamente um dos diversos meios auxiliares de que nosso pensamento se serve para esse efeito; e b) porque nenhum dos acontecimentos culturais poderá ser concebido senão com base na significação que a realidade da vida, sempre configurada de modo individual, possui para nós em determinadas relações singulares»٧٣.

Todo conhecimento da realidade cultural é sempre um conhecimento subordinado a pontos de vista especificamente particulares/subjetivos. Por isso propõe-se a premissa elementar de que o pesquisador deve saber referir os elementos da realidade a «valores culturais» universais e destacar as conexões que se revestem de significado. A relação de causalidade entre a ideia historicamente comprovável que domina os homens e os elementos da realidade histórica dos quais se pode fazer a abstração do tipo ideal correspondente pode adotar formas extremamente variáveis. Só mediante fórmulas conceituais típico-ideais é que se chega a compreender realmente a natureza particular dos pontos de vista que interessam no caso particular, graças a um confronto entre o empírico e o tipo ideal. A «objetividade» do conhecimento no campo das ciências sociais depende antes do fato de o empiricamente dado estar constantemente orientado por ideias de valor, que são as únicas a conferir-lhe valor de conhecimento74.

Como consequência das postulações de Weber a noção de objetividade, bem como a de causalidade necessária e intrínseca à ciência e às explicações racionais75, houve o reconhecimento da incongruência entre os métodos e as premissas das ciências naturais –tidos como o modelo de ciência– a partir dos quais se fazia a transposição para o estudo dos fenômenos humanos. Esse reconhecimento aliado a proposição de formas alternativas de investigação, sobretudo qualitativas inspiradas na fenomenologia estrutural76 e na antropologia77 serviriam de bases para a colocação da ciência dos fenômenos sociais em outro patamar. Surgia, porém, um novo obstáculo: como assegurar que os valores não ‘contaminem’ os fatos? Seria possível generalizar achados relativos às experiências sociais de grupos em contextos específicos?

O que estas passagens evidenciam é o reconhecimento das especificidades das ciências sociais. Mas, ainda preso a uma visão paradigmática monoplanar tal reconhecimento levou a um processo (lógico até então) de deslocamento dos critérios científicos do polo realista da visão sobre a ciência para o oposto deste pêndulo, i.e., uma visão essencialmente antirrealista e relativista da realidade. Todavia, como posições opostas de um mesmo continuum tal processo impedia a existência de cada um desses paradigmas –de forma legítima e científica– simultaneamente sem que um deles viesse a incorporar o outro. Tal problema é resolvido, no entanto, quando se salta de uma visão monoplanar para uma visão ontológica estratificada, isto é, onde a realidade é concebida em vários níveis, segundo os tipos de objeto, suas estruturas causais e tendências.

Atualmente as ciências sociais, de uma forma ampla, têm sido condicionadas cada vez mais a explicitarem sua relevância prática para a sociedade através de benefícios materiais ou simbólicos advindos de sua adaptação e implementação na prática. O atual estágio de desenvolvimento técnico científico tem evidenciado cada vez mais a busca pela integração e buscado formas de gerar conhecimento que estejam relacionadas com a prática78. A visão da ciência como algo distinto e especial, longe da realidade prática, tem sido cada vez mais desafiada e deixada de lado. Diversos movimentos nas ciências em geral, e nas ciências sociais em particular, têm evidenciado a busca por uma nova forma de fazer ciência, mais ampla, completa e complexa, que vise integrar e/ou superar as tradicionais formas de pensamento que emperram a superação de obstáculos como as díades teoria-prática, agência-estrutura; micro-macro; etc.79, 80 em direção a integração de tradições de pesquisa que por partirem de pressupostos diferentes tendem a fragmentar o campo científico. Esses movimentos têm se dado em diversas áreas: na psicologia social com o construcionismo social de Gergen81, na área ambiental com o paradigma ambiental de Leff82, nas ciências sociais com a teoria da complexidade de Morin83, o realismo crítico de Bhaskar84; com diversos enfoques, mas todos, de uma forma geral tentam abranger outras áreas na busca de uma integração entre as ciências.

Três Questões Centrais sobre Pesquisa-ação

Contexto de Surgimento

Há certo consenso com relação a alguns elementos da pesquisa-ação, como o modo de entrada e participação dos pesquisadores, uma vez que ela está preocupada genuinamente com os atores no processo de mudança de uma realidade social; o espaço comunicativo, ou seja, trazer à tona juntos (todos os atores) os assuntos, problemas e tópicos relacionados que sejam compartilhados pelos membros85.

Segundo Gustavsen86, o marco inicial da PA tem sido usualmente associado aos trabalhos realizados pela primeira geração de pesquisadores do Tavistock Institute of Human Relations, criado logo após o fim da II Guerra Mundial, em 1946, e que foi considerado o centro pioneiro no desenvolvimento e aplicação da PA.

Embora os estudos daquela época focalizassem, majoritariamente, a produtividade, eles tendiam a considerar os recursos necessários para que os trabalhadores tivessem um comportamento ativo na solução de problemas no ambiente de trabalho. A ideia central dos estudos desenvolvidos naquela época neste instituto era introduzir formas de trabalho que fizessem o possível para que os trabalhadores retivessem a sua subjetividade e se tornassem ativos, agentes criativos no ambiente de trabalho. Porém, os pesquisadores enfrentavam um desafio: como introduzir mudanças (novas formas de trabalho mais ativas, que enriquecessem o ambiente de trabalho e a criatividade dos empregados) ao mesmo tempo em que pudessem estudar essas intervenções de modo científico?

Foi nesse contexto que os princípios da PA começaram a ser desenvolvidos, a partir, principalmente, da questão de como trazer a teoria para os problemas práticos de desenvolvimento da vida no trabalho87. A PA, então, entrou como um elemento operacional para desenvolver na prática melhorias no ambiente de trabalho, visando em última instância aumentar a produtividade, mas de modo atrelado ao enriquecimento das atividades e da participação mais ativa e efetiva dos funcionários.

Reason e Brabury definem pesquisa-ação como «um processo participativo preocupado com o desenvolvimento de conhecimento prático perseguindo propósitos humanos [...] [que] procura trazer junto ação e reflexão, teoria e prática»٨٨. Porém, a pesquisa-ação tem sido muito usada para descrever e justificar as atividades organizacionais diversas (89, 90, 91, 92). Para Cassell e Johnson93 os significados anexados ao termo, as fontes de inspiração desdobradas e as práticas que essa visão sanciona são tão diversas que nem parece ser uma teoria unificada.

Tal diversidade de uso exige que se faça um duplo resgate: de um lado, acerca da historicidade da pesquisa-ação, evidenciando seu surgimento, desenvolvimento e às ideias subjacentes a essa estratégia de pesquisa; e, de outro, um resgate epistemológico das tradições de pesquisa associadas a essa forma de produção de conhecimento científico e de intervenção social.

A seguir, serão exploradas as questões problemáticas que (1) a possibilidade de integração teórico-prática como forma de produção de conhecimento científico; o que requer um debate sobre (2) o problema da generalização, ou como realizar a transferência do conhecimento científico (particular), gerado a partir do contexto de desenvolvimento da pesquisa-ação para outros contextos (geral); e (3) o estatuto científico da pesquisa-ação, a fim de se estabelecer as possíveis bases a partir das quais se pode desenvolver, de modo cientificamente justificado e legítimo, este tipo de pesquisa.

Integração entre Teoria e Prática ou o Problema da Produção
de Conhecimento e Intervenção Simultâneas

A possibilidade de conciliação entre produção do conhecimento científico concomitantemente ao processo de alteração na realidade social (94, 95 ,96), que pode acontecer em qualquer contexto (macro) social ou organizacional (mesossocial)97 de modo planejado, organizado98, sem que nenhum dos dois tipos de ação (pesquisa ou procedimentos de intervenção) sobrepuje o outro.

Assim, a PA não encontra abrigo no seio das tradições científicas inspiradas na separação dicotômica entre sujeito e objeto; entre teoria e prática; entre produção e justificação do conhecimento científico gerado, mas o encontra no seio das tradições que contemplam uma visão dinâmica da realidade social, onde o homem é sujeito e objeto, agente ativo e passivo do processo de produção da realidade e ciência, sendo a validade desta revelada não pelo critério de antecedência da realidade, mas pelo caráter eventual e contínuo da atividade humana99.

O conhecimento científico clássico tem sido feito segundo o modelo paradigmático de pesquisa proposto pelas ciências naturais, baseado nos princípios do reducionismo, replicabilidade e refutação100. Nessa perspectiva, somente se os resultados dos experimentos fossem replicáveis, eles contariam como parte de um corpo de conhecimentos, pois nesta acepção o progresso científico seria feito com base na sequência de experimentos através do teste e de eliminação de hipóteses. Uma implicação dessa perspectiva é o fato de que o poder do método científico jaz na replicabilidade de seus resultados, que transforma seus achados em conhecimento público.

Considerando este marco, e o modelo de ciência dele derivado, pode-se inferir porque a PA tem sido um método científico marginal em relação ao mainstream. Todavia, mesmo dentro dele há quem o recupere com a vistas à aproveitar suas «funcionalidades» no processo de mudança social planejada, mas apenas de um estado de coisas específico e não da ordem social mais ampla. A esse respeito, Cooke101 realiza uma conexão entre a Guerra Fria e a ascensão da vertente gerencialista de pesquisa-ação, que se sobrepôs à vertente de PA mais engajada e preocupada com problemas sociais, pois esta foi associada a uma visão de concepção socialista, fortemente reprimida no contexto anglo-saxão (e ocidental) do pós-IIGM.

Em sua análise102, o autor mobiliza dois precursores da PA, que discutiram ativamente sobre a forma como se deveria aplicar esse método, a fim de evidenciar a tensão estabelecida, desde o início, entre uma vertente mais neutra e outra engajada da PA. De um lado, Lippitt, psicólogo social e cientista, conservador, defensor da neutralidade científica e dos métodos como meio de garantir o fazer científico (ainda que ele não ignorasse o resultado desse processo e a possibilidade do pesquisador influenciar nele), enfatizava a pesquisa e ainda mais os níveis microssociais de análise. Para ele, a mudança certamente não é algo bom nem ruim, é apenas um fato. Na sua concepção, a aplicação dos princípios de metodologia científica define o melhor processo de mudança nas relações humanas através dos padrões mais apropriados. De outro, Collier, um administrador público, que defendia uma posição científica mais engajada na realidade social mais ampla, que viria a redundar em uma diferente postura, inclusive científica e metodológica, do pesquisador e no reconhecimento do seu papel na sociedade. Para ele a PA requisitava um engajamento no domínio social além daquele imediato aos participantes. Dentro de um contexto autoritário, pode-se ter todos os tipos de resultados, menos a razoabilidade.

Sobre este aspecto, os autores103 afirmam que obviamente o processo científico baseado nos fenômenos sociais, em particular o da PA, não permite a produção de leis e generalizações a partir de uma única situação, mas, em todo caso, a PA não assume que as ‘leis sociais’ aguardam serem descobertas do mesmo modo que as leis físicas, que podem ser observadas como regularidades do universo no qual fazem recorrência independente do fato de elas terem ou não ainda sido notadas e codificadas. Por sua vez, um processo de PA organizado seriamente pode ser feito para gerenciar generalizações ‘defensivas’, mediante algumas modificações como temas substituindo hipóteses; o reconhecimento do papel de pesquisador e ator simultaneamente; a arbitrariedade para a finalização do processo; e a utilização de protocolos para a transferência de extensiva por meio do critério de recuperabilidade de práticas e processos104.

A replicabilidade do experimento sustenta o fato de que o fenômeno investigado deve ser homogêneo ao longo do tempo105, porém, nas ciências sociais eles não se apresentam dessa forma, pois a sobreposição, –ainda que parcial– entre sujeito e objeto de pesquisa, interfere na objetividade de observação do fenômeno; na sua (in)capacidade de replicabilidade e, por conseguinte, na formulação de conhecimentos científicos a respeito desses fenômenos sociais. Assim, o fato da exterioridade do objeto nas ciências naturais permite que as concepções teóricas formuladas a respeito da natureza não a afetem diretamente, entretanto acontece o oposto no domínio das ciências da cultura: «[...] o modelo heliocêntrico de Copérnico é inteiramente não afetado pela nossa teorização a respeito dele, mas a teoria marxista da história tem a capacidade de mudar a história!»١٠٦.

Assim, devido ao fato de os fenômenos sociais estarem sobrepostos ao sujeito que os observa e não serem homogêneos ao longo do tempo, o modo de observação desses fenômenos deve recorrer a um conjunto de concepções teóricas e metodológicas que sejam capazes de apreender as especificidades dos fenômenos sociais, permitindo a sua descrição, compreensão e explicação científica107.

O Estudo do Pequenos Grupos Sociais e o Problema da Replicação (ou Generalização Científica)

Assim, embora inicialmente estivessem preocupados com a introdução de conhecimentos teóricos e novas formas e técnicas no ambiente de trabalho, aos poucos o modo pelo qual essas modificações passariam a ser realizadas foi gradualmente despertando a atenção dos pesquisadores, culminando com a elaboração de um protocolo de pesquisa do que mais tarde viria a se chamar PA.

A emergência da PA como ponta de lança do processo de mudança se deu, de modo mais efetivo, a partir do momento em que os pesquisadores do Tavistock Institute juntamente com a Confederação Norueguesa de Empregados e a Confederação da União do Comércio trouxeram à tona uma iniciativa conjunta. A partir dessa integração, os pesquisadores puderam demonstrar, em termos práticos, quais ideias eles queriam promover, bem como as suas ideias de habilidades que seriam adquiridas para então promovê-las no ambiente de trabalho concreto.

Assim, as indústrias abriram as suas portas para os pesquisadores. Durante os anos 60 foram realizadas diversas experiências com grupos de trabalho autônomos nas áreas de plantas mecânicas, fábrica de papel, produtores de fertilizantes, entre outros; sendo que estes foram os mais bem-sucedidos. Apesar desse sucesso, o processo não poderia se limitar a 4 grupos de trabalho (experiências) e, então, um novo problema –surgido no começo dos anos 1970 e que permanece até– entraria em cena: como difundir e replicar essas experiências em larga escala?

Enquanto que as primeiras experiências atraíam a atenção dos gerentes integracionistas, a maioria dos atores no ambiente de trabalho tinha uma tendência inicial a rejeitar as ideias para as quais não possuía condições específicas de participação em seu meio. O desafio então foi tornar as ações do projeto em uma forma mais participativa.

Quando as primeiras experiências foram realizadas, esperava-se que se tivesse um efeito de bola de neve, onde rapidamente seus resultados se espelhassem (tendendo então a diminuir a necessidade dos inputs de pesquisa em novos casos). Porém, com a necessidade de maior atenção às variáveis locais, a PA emergiu com um largo espectro de variações em diferentes projetos e ambientes de trabalho, dificultando assim a homogeneidade em ternos de práticas e a possibilidade de sedimentação, validação e replicação dos achados em cada contexto. Então, passou-se a questionar: o que a guinada, em termos de participação local, implica para este tipo de teoria?108.

A problematização das formas de pesquisa «participatórias» pode ser vista de duas formas: de um lado aquelas que valorizam a função instrumental e a sua eficácia; e, de outro, aquelas que encaram este tipo de pesquisa como um modo de dominação. Segundo Cooke109, a PA é vista como uma cooptação crítica, pois o foco no significado da mudança obscurece as questões sobre seus fins, e no mínimo, se as mudanças em jogo são de interesse dos participantes. Além disso, os métodos participativos facilitam a cooptação daqueles que poderiam, de outro modo se opor as mudanças em questão. Outra crítica ao possível caráter cooptativo da PA reside na limitação do empoderamento adquirido pelos participantes, o qual parece ser restrito aos processos do micro nível organizacional, enquanto que as práticas e estratégias mais amplas permanecem inalteradas.

Natureza do Conhecimento baseado na Pesquisa-Ação ou o Problema Epistêmico

Cassell e Johnson110 mostram que a diversidade de modalidades de PA surgidas desde os trabalhos de Kurt Lewin e dos estudos do Tavistock Institute, no pós-guerra, até hoje não é fruto da casualidade, mas sim da diversidade de fundações epistemológicas a partir das quais partem os pesquisadores. Fundações essas que permanecem tácitas nos trabalhos e que contribuem para dificuldade de se atingir um status científico pela PA. Tal diversidade de domínios de origem parece não unificar as teorias, pelo contrário: permite a apropriação pelos pesquisadores pós-modernos em diferentes –às vezes, opostas– conotações.

De modo geral, a PA pode ser polarizada em torno de duas visões diferentes dos pesquisadores ao seu respeito: de um lado, aqueles que enfatizam como a PA integra a teoria com a prática por meio de um sistemático inquérito científico auto-reflexivo feito pelos praticantes para desenvolver a prática; e, de outro, aqueles que a consideram como um inquérito apreciativo que constrói o sucesso organizacional mais do que a solução de problemas111.

A primeira vertente, segundo Cassell e Johnson112, estaria baseada na noção de verstehen (entendimento interpretativo), originária de um polo indutivo, de onde a PA seria vista como uma forma de se focar na construção de um quadro interpretativo e a partir de aí gerar teorias. Ou seja, gerar o desenvolvimento de um entendimento interpretativo das teorias em uso dos participantes, em oposição às teorias esposadas, para ajudar a reduzir rotinas defensivas e contribuir para o aprendizado e reconfiguração decision making. Já os pesquisadores da segunda vertente baseariam seu entendimento (sobre ciência e, por extensão, PA) na noção de erklaren (explicação causal), associada às premissas do pensamento dedutivo; e que veria como pivô da PA a análise causal dedutiva: ou seja, nesta segunda interpretação, a lógica de PA seria dada pelo processo de: identificação de problemas, construção de hipóteses, diagnosis, planejamento, intervenção e avaliação de resultados a fim de aprender e planejar intervenções subsequentes.

Porém, a suposta concentração da PA nesse ciclo interativo de caráter pragmático tem sido um dos principais elementos de crítica e, ao mesmo tempo, de disputa entre pesquisadores de diferentes tradições filosóficas. Enquanto alguns defendem o caráter pragmático como uma forma de se associar teoria e prática, levando o conhecimento científico para a resolução de problemas da vida real em conjunto, por meio do diálogo e da aquisição de consciência crítica, com os atores afetados pelos problemas; outros estudiosos criticam essa postura por acharem que ela nada mais é do que uma forma de produzir e potencializar o controle social e mudanças desejadas pela cúpula, agindo de duas formas: pela nova forma de ação legitimada pelos membros externos (que detém um conhecimento específico e superior ao dos atores internos) e por contar com a participação do grupo, e usar o espaço organizacional para facilitar e nutrir as mudanças desejadas113.

Em um trabalho seminal dedicado especificamente à questão da epistemologia da PA, Paul Oquist114 aborda cinco tradições de pesquisa diferentes –empirismo, positivismo lógico, estruturalismo, pragmatismo e materialismo dialético– para realizar uma análise comparativa acerca dos pressupostos epistemológicos de cada uma dessas tradições, cotejando-as com as características da PA, identificando quais seriam as tradições, de fato, fornecem bases possíveis para a sustentação da PA. Para realizar tal comparação, aparando as arestas entre o debate teoria versus prática e ideologia versus ciência –questões que permeiam a fronteira tênue entre conhecimento científico e ação social, que são os principais fundamentos da PA– Oquist115 considera cinco questões como categorias fundamentais e que estão presentes, de forma diferenciada, em cada uma das tradições analisadas: (1) o modo como o homem produz o conhecimento; (2) o modo como o homem justifica o conhecimento; (3) qual a relação entre teoria e prática; (4) qual a relação entre valores ou ideologia e ciência; e (5) quais as implicações para a PA (cf. quadro 1).

O status da PA como conhecimento científico depende da perspectiva116, 117. De modo geral, ela é marginalizada, já que tem como referencial o positivismo. Todos os caminhos de ciência são contestáveis, porém, se critica mais os outsiders porque tem-se como referencial o positivismo. Contudo, é possível identificar como as diferentes tradições se legitimam. Isso traz, segundo o autor, algumas implicações, tais como: (1) ao selecionar uma fundação é preciso informar qual e justificar sua escolha e, sempre que possível, buscar fazer pontes com outras ou pelo menos visualizar alternativas para a solução do mesmo problema; (2) ao observar que há diferentes abordagens é preciso sair do critério de validade positivista e considerar os outros também.

O que se propõe aqui é uma discussão das categorias propostas por Oquist118 à luz do realismo crítico, complementando então o quadro originalmente proposto por aquele autor. Para tanto, exploraremos a seguir algumas características chave do realismo crítico, de forma a embasar, uma leitura realista crítica da PA.

O Realismo Crítico: Proposições e Elementos Centrais

A despeito da pluralidade de ideias, conceitos e teses propostas e desenvolvidas no âmbito que se convencionou a chamar de realismo transcendental, partindo da escola bhaskariana, muitos desdobramentos ocorreram e, devido à impossibilidade de se esgotar todo o assunto neste único ensaio, é que recorreremos à estratégia de apresentar, de forma sumarizada, as principais categorias que devem ser observadas dentro da perspectiva realista transcendental119.

Em geral, o RC trabalha com duas teses centrais: a reivindicação da ontologia e sua irredutibilidade à epistemologia; e a estratificação desta ontologia, a partir de mecanismos generativos ativos, dos eventos observáveis e dos fatos observáveis, que podem se manifestar ou não120.

A ontologia refere-se ao domínio da realidade propriamente dita, na acepção de realidade ou do objeto em si, sendo este possuidor de propriedades e características intrínsecas que orientariam o processo de investigação, delineando até que ponto e de que maneira ele poderia ser feito. O RC adota como posição a ontologia realista, em que a realidade é vista como algo ou entidade que existe ‘lá fora’, isto é, de modo exterior e independente do ser humano ou do conhecimento que ele possa ter ou vir a ter da realidade.

Segundo Bhaskar121 este domínio ontológico –ou dimensão intransitiva, já que ele é/existe por si só, independente de complemento– é constituído de diferentes estratos ou níveis, aos quais se pode (ou não) ter acesso e gerar conhecimento: o empírico, que é o mais superficial estrato da realidade e constitui-se das manifestações empíricas de um dado fenômeno, e que, portanto, podem ser observadas; o estrato fenomênico, que seria um segundo estrato da realidade, não necessariamente observado, referente aos eventos ou a ocorrência de sucessivas transformações na realidade; e o estrato do real, terceiro e mais profundo nível da realidade, que remeteria às propriedades internas e intrínsecas de cada entidade (coisa em si) e que seria responsável por desencadear a atuação das manifestações de um fenômeno, nos demais níveis, já que aqui neste nível é que residiram, de forma imanente –os poderes causais das entidades, sendo ativados mediante a sua exposição a determinadas circunstâncias122.

Fleetwood123 ainda acrescenta que uma «entidade é tida como sendo real se ela tiver uma eficácia causal, um efeito sobre o comportamento, fizer alguma diferença». A confusão que geralmente é feita baseia-se na acepção tomada literalmente e acriticamente de uma (errônea) equivalência entre o ‘real’ e a ‘existência material’ ou física de uma entidade; e, por oposição, a equivalência (também errônea) entre o ‘não-real’ como sendo entidades ‘não-materiais’ ou sem existência física. Além disso, há que se considerar, segundo o mesmo autor, que as entidades reais podem sobrepor dois modos distintos ou mesmo passar de um modo a outro, já que tipicamente elas estão sempre em evolução e mudança.

Contrariamente a essa visão superficial e acrítica, os realistas críticos apontam que muitas coisas são reais, mas de diferentes modos, sendo possível identificar pelo menos quatro formas de realidade: (1) a material, que se refere a entidades materiais como a água ou a terra, que existem independente do que os indivíduos ou comunidades façam, digam ou pensem; (2) a ideal, que se refere a entidades conceituais tais como discurso, gênero, símbolos, etc. que podem ser entendidas como entidades discursivas, e que têm eficácia causal e que podem ter (ou não) um referente que pode ser idealmente real (ou não); (3) a artefactual, referindo-se a entidades –tais como cosméticos ou computadores– que são uma síntese de entidades física-ideal-socialmente reais; e (4) a social, que se refere a práticas, estados de coisas, estruturas sociais que constituem organizações humanas124.

Um segundo elemento central dentro do RC é a dimensão transitiva do conhecimento –ou epistemológica– que ao invés de orientar o processo de descoberta científica, passa a ser orientada pela dimensão intransitiva ou ontológica. Jessop125 coloca que o conhecimento –domínio transitivo– é feito através de um processo contínuo de confrontação entre hipóteses teóricas retroductivas sobre os objetos intransitivos e demonstrações evidentes (ou evidenciáveis), geradas através da investigação transitiva. Estas demonstrações são mediadas pelo resultado da investigação científica e nunca refletem diretamente o domínio real ou o fenômeno atual (domínio efetivo).

Assim, chega-se a um terceiro elemento central do RC: o processo de racionalização científica (rationale). No RC, a busca pela racionalização e explicação científica percorre um caminho diferente do paradigma convencional. Com questões como: de que modo o mundo/realidade tem que ser para que seja passível de conhecimento por nós?; e «que propriedades possuem as sociedades que podem torná-las possíveis objetos de conhecimento para nós?» (Bhaskar126 1998, 1), Bhaskar inverte a tradicional lógica de questionamento, passando da ênfase na agência (como eu conheço o mundo?) para a ênfase no objeto ou coisa em si (como ele é ou deve ser para que possa ser conhecido?) e com isso mudou o sentido e a orientação do raciocínio filosófico e científico –no realismo transcendental– gerando o que ele chama de retroducção (retroduction).

Uma (re)visão realista crítica sobre o status da Pesquisa-Ação127

Oquist128 considera cinco questões como categorias fundamentais e que estão presentes, de forma diferenciada, em cada uma das tradições analisadas: (1) o modo como o homem produz o conhecimento; (2) o modo como o homem justifica o conhecimento; (3) qual a relação entre teoria e prática; (4) qual a relação entre valores ou ideologia e ciência; e (5) quais as implicações para a PA (cf. quadro 1). Tais categorias serão analisadas, a seguir, à luz do RC a fim de confrontrar esta rationale com a das demais tradições de pesquisa, previamente identificadas pelo autor.

Modo de produção do conhecimento

Para Bhaskar129 uma das características mais significantes das ciências sociais é que o fenômeno social ocorre somente em sistemas abertos, enquanto que na esfera natural há a possibilidade de fechamento artificial desses sistemas, como observado na física ou na química, e de fechamento parcial, gerando sistemas quase-fechados na biologia, mas com alto grau de controle das variáveis. Daí segue-se que situações decisivas de teste são impossíveis. Então, o critério de escolha de uma teoria ou desenvolvimento teórico deve ser exclusivamente explicativo e não preditivo.

Como consequência haveria duas posições extremas do fato de se ter sistemas abertos: uma seria a possibilidade de se negar qualquer controle a posteriori numa teoria independente de sua aplicação prática, o que ressaltaria o caráter de impossibilidade de teste preditivo. A outra seria a observação do uso de uma bateria de técnicas estatísticas como moderadamente adequada para se tentar substituir o fechamento experimental, o que negligenciaria os limites qualitativos da medição e a probabilidade de variação dos sistemas abertos. Porém, é necessário esclarecer que isso não implica desprezar as previsões condicionais na ciência social. Além disso, uma teoria explicativa poderosa seria capaz de situar possibilidades mesmo antes de elas serem manifestadas, conferindo assim uma função prognostificativa no domínio social à teoria.

Embora reconhecendo a necessidade de procedimentos metodológicos eventualmente distintos entre as ciências sociais e naturais, o RC não especifica que técnicas podem ou devem ser utilizadas e quais não podem ou não devem, deixando a questão aberta à própria verificação transfactual na realidade. Bhaskar gera um modelo de explicação científica em sistemas abertos, composto por 4 fases:

1. Resolução de um evento complexo em seus componentes (análise causal).

2. Redescrição das causas componentes.

3. Retroduction a possíveis causas (antecedentes) de componentes via afirmações nórmicas validadas de modo independente.

4. Eliminação de causas alternativas possíveis dos componentes. (itálicos no original, tradução livre).

Este modelo, denominado de modelo RRRE de explicação em sistemas abertos, testemunha a multiplicidade e pluralidade de causas nos passos 1 e 4, respectivamente. Além disso, nas fases 2 e 3 é sublinhado o papel chave desempenhado pelas atividades científicas de redescrição e aplicação transfactual do conhecimento –sendo ambas estritamente incompatíveis com o relato humeniano130.

Modo de justificação do conhecimento

Segundo Jessop131 metodologicamente o RC aponta para a necessidade de se descobrir quais são as condições necessárias e suficientes para um dado explanandum. De acordo com Bhaskar, as «[...] simples generalizações empíricas somente são aceitáveis na ausência de conhecimento sobre os poderes causais ou mecanismos e outras condições que formam a melhor base para a retroducção descobrir os mecanismos e obter as condições que os geram».

A retroducção é um tipo de raciocínio lógico-filosófico (passível de ser transposto para campo científico) que embasa o pensamento dentro deste paradigma. Ela formula um questionamento que visa reconstituir a trajetória de formação de uma entidade a partir de seu estágio atual, em direção ao passado. Por exemplo: Como teria que ser X para que se tornem objetos de conhecimento para nós? Que propriedades teriam o objeto X para que ele se tornasse objeto de conhecimento para nós (fosse possível ser conhecido)? Este tipo de operação «[...] envolve um questionamento do que o mundo real deve ser para que um explanandum específico seja atualizado e, como tal, difere da indução empírica e da dedução lógica132».

Tal procedimento é de caráter geral –assim como a indução ou dedução, embora difira destes pelo fato de que envolve um questionamento sobre como o mundo real deve ser para que um determinando explanandum seja realizado– e, portanto, não requer uma técnica específica para sua aplicação. Ao contrário, pode recorrer à «[...] experimentação, medição, observação, etc. sendo estes procedimentos sempre contingentes, falíveis e, talvez, corrigíveis». Por esta razão o RC abraça o relativismo epistemológico.

O problema, então, de como resolver qualquer inconsistência entre hipóteses e evidência seria determinado dentro do paradigma prevalecente (hegemônico), com suas regras da ciência. Mas, para estas regras serem aceitas como científicas, elas devem prover uma base para julgamento racional entre diferentes reivindicações. Estas regras pertencem ao aspecto transitivo da ciência e por isso estão sujeitas a revisão e desenvolvimento. Assim, o relativismo epistemológico aqui empregado pelo realismo não se confunde ou compartilha do relativismo julgamental (i.e., a visão de que qualquer julgamento pode ser tão bom quanto qualquer outro). Afirmações competitivas sobre o mundo intransitivo são frequentemente (mas nem sempre) possíveis de serem feitas133.

Relação entre teoria e prática

Bhaskar134 introduz o Modelo Transformacional da Ação Social (TMSA) de Bhaskar de modo similar a Giddens, na esteira do relato da estruturação. Porém, segundo Jessop135, diferentemente de Giddens, Bhaskar desenvolveu seu modelo em linhas novas e mais compreensíveis.

Para tanto, inicialmente, ele trata do problema diferindo em termos ontológicos entre sociedade e pessoa. Em seguida, rejeita as três posições ‘centrais’: atomismo social e individualismo metodológico; reificação social e coletivismo metodológico e a visão comprometida de que indivíduos criam a sociedade e sociedade produz indivíduos em processo dialético contínuo136.

Assim, como Archer procede no foco da mediação contingencial por meio de práticas específicas que são capacitadas, assim como constrangidas, pelas posições sociais que pessoas enquanto agentes ocupam. «[A] Sociedade é um conjunto de estruturas, práticas e convenções com suas próprias propriedades emergentes e seus efeitos materiais; mas, estas propriedades e efeitos distintivos não são permanentes e sua reprodução (ou transformação) requer o desempenho de práticas apropriadas137».

Correspondentemente, enquanto os «atores são [considerados como seres] distintos destas estruturas (e podem, portanto, refletir sobre elas e buscar transformá-las), sua capacidade de agir e o impacto de suas ações dependem das posições específicas que eles ocupam nestas estruturas, dos recursos que elas controlam, sua capacidade de monitorar o que elas estão fazendo e seus efeitos e, é claro, as ações específicas que elas desempenham138».

É advogada a superioridade deste modelo em relação ao de estruturação apresentado por Giddens porque ele capacita a análise da efetividade material das propriedades emergentes das estruturas, incluindo a divisão do trabalho e a alocação de recursos. A mediação entre estrutura e agência de Giddens fica flutuando livremente enquanto a de Bhaskar tem pontos certos e fixos de contato e é diferencialmente distribuída e corretamente alocada.

Sociedade é ambos, a sempre presente condição (causa material) e o resultado continuamente reproduzido pela agência humana. E a práxis é ambos os trabalhos, ou seja, a produção consciente, e a reprodução (normalmente inconsciente) das condições de produção, ou seja, a sociedade139.

Relação entre valores ou ideologia e ciência

Dada a posição ontológica (intransitiva) defendida pelo realismo crítico, cuja primeira afirmação é a de que a realidade existe externa e de forma independente ao observador, a dimensão epistemológica (ou transitiva) assume caráter tributário e decorrente em relação àquela. Nesse sentido, toda forma de conhecimento é apenas uma forma de apreensão –parcial e seletiva– da realidade. Portanto, a ciência é apenas mais uma forma de conhecimento, assim como outras existentes, em relação à realidade. Disso não decorre necessariamente que a ciência seja mais ou menos importante (dimensão axiológica –pois tal inferência, decorre de e, implica um juízo de valor) do que as demais. Nem que a ciência não seja útil ou precisa. Apenas refere-se ao fato de que as ciências –como forma de conhecimento, por definição, transitivo– precisa conhecer seus limites para que possa desempenhar de forma adequada sua tarefa. O desconhecimento dos seus próprios limites poderia levar ao erro da extrapolação de seus resultados (erro do positivismo –pela afirmação de leis gerais universais) ou mesmo sua subdeterminação (erro do interpretativismo– ao contextualizar todo conhecimento e evitar sua generalização).

Portanto, apenas uma perspectiva realista e, em particular, metaparadigmática (como o realismo crítico), é capaz de sustentar um relato adequado da ciência. Nenhuma das abordagens pós-modernas pode fazê-lo –nem a integração ao paradigma positivista nem a sua substituição por outro–, pois, de um lado, elas não são capazes de sustentar (e dar conta) qualquer concepção realista da realidade, ou seja, qualquer manifestação extradiscursiva (e, portanto, não humana140) não tem lugar se não for mediada pelos seres humanos e reduzida à ordem social141. Por outro, como são ontologicamente mudas142, essas abordagens são empírica, pragmática e, mesmo, [eu diria principalmente] politicamente descomprometidas143 com qualquer mudança ou intervenção na realidade, já que, em sua visão relativista, qualquer julgamento valorativo, moral ou ético, ao final, seria tão bom ou válido quanto qualquer outro144.

Para as ciências sociais, Bhaskar desenvolve um naturalismo antipositivista, propondo que sejam adotadas como unidade de análise as relações entre os objetos –tanto para as ciências naturais quanto para as ciências sociais. Da combinação de tais objetos, isto é, das relações (ou interações) que eles mantêm entre si, é que emergiriam os poderes causais, levando assim a manifestação de um dado fenômeno. A principal –e advogada superior– diferença relacional é que os objetos do conhecimento científico, embora existam intransitivamente, são causalmente interdependentes do conhecimento do qual eles são os objetos. Isso leva imediatamente à diferença crítica, que se torna uma ruptura, por meio do conceito de crítica explicativa, do padrão distintivo fato/valor e teoria/prática, num modo que tem sido parcial e debilmente realizado de forma análoga às ciências naturais.

Essa manobra inicial e fundante das análises bhaskarianas levou a uma concepção de ciência distinta, cujo modelo baseia-se em três elementos: identificação, construção de modelos hipotéticos de explicação e teste.

A ciência identifica um fenômeno (ou um conjunto de fenômenos), constrói explanação para ele e empiricamente testa suas explicações, levando à identificação dos mecanismos (causais) generativos no seu trabalho (processo), os quais, agora, se tornam o fenômeno a ser explicado, e assim por diante. Neste contínuo processo, como os níveis mais profundos ou os estratos da realidade são sucessivamente un-folded, a ciência deve construir e testar suas explicações com os recursos cognitivos e as ferramentas físicas que tem à sua disposição, as quais, durante este processo, são progressivamente transformadas, modificadas e refinadas145 (destaque no original, tradução livre).

Implicações para a PA

Para satisfazer os requisitos epistemológicos do realismo crítico, a pesquisa-ação deve estar ligada aos condicionamentos estruturais ontológicos (espaço-tempo), aos mecanismos gerativos contextuais e suas formas de manifestação fenomênicas, bem como nas manifestações empíricas mais visíveis. A busca teleológica pela emancipação requer deste tipo de estratégia a melhoria do sistema social analisado de forma mais ampla, mitigando assim usos puramente instrumentais e/ou cooptativos.

O RC oferece essa possibilidade na medida em que opera com uma lógica transfactual de identificação das estruturas e poderes causais das entidades, bem como dos mecanismos e circunstâncias contextuais que operam somente como tendências em um sistema aberto (onde não necessariamente há uma conjunção constante de eventos para geração de leis científicas. De fato, esta situação parece ser apenas um caso limite dentro de uma lógica transfactual em sistemas abertos).

Nesse contexto, a PA encontra um fértil campo de aplicação tornando-se importante por várias razões. Primeiro, porque enquanto procedimento de pesquisa, a pesquisa-ação conduz a geração de um conhecimento antes inexistente ou inacessível pelos atores organizacionais envolvidos no contexto. Uma segunda razão é que a pesquisa-ação, enquanto procedimento de ação, gera –a partir dos conhecimentos produzidos– diretrizes de ação para viabilizar a solução de problemas enfrentados pela organização e pelos atores sociais nela envolvidos. Por fim, uma terceira razão consiste no entendimento da pesquisa-ação como um mecanismo de mediação e negociação da mudança com as diferentes partes da organização e atores envolvidos.

Outra questão que merece ser relatada é a do aprendizado organizacional, ou seja, a de transferência do conhecimento tácito ou informal para um saber deliberado ou formalizado dentro da organização. Isso ocorre porque a pesquisa-ação ao proporcionar a participação e o envolvimento dos atores organizacionais nas situações de mudança, estimula a troca de informações e de saberes entre os atores sociais.

Além disso, como a pesquisa-ação parte do pressuposto de que haverá um contínuo processo de mudança de diagnóstico, definições de problemas a serem solucionados, implementação da pesquisa-ação e feedback, o processo de geração de conhecimento atinge uma fase de retroalimentação constante.

À Guisa de Conclusão ou Como o Realismo Crítico
pode Fundamentar a Pesquisa-Ação

O objetivo deste trabalho foi rever o método de PA à luz do realismo crítico. A seu respeito dois aspectos merecem ser destacados: 1) o fato de que a PA está preocupada com a geração de conhecimento; 2) diz respeito à PA enquanto tecnologia social de intervenção na realidade, cujos conhecimentos gerados pela pesquisa serão a base de suporte para as intervenções no sistema social.

Devido ao fato de que as bases teóricas e epistemológicas da PA propõem um método alternativo de pesquisa, que seja comprometido com a geração de conhecimento e ao mesmo tempo com a aplicação desse conhecimento no sistema social, a fim de que o mesmo se traduza em melhorias para todos os atores sociais envolvidos naquele processo, há uma convergência crucial em relação ao RC, que também visa a produção de conhecimento para a transformação dos sistemas sociais.

Todavia, por estar presa aos cânones do modelo humeniano e positivista de relações causais para a produção e validação do conhecimento científico, a PA não consegue assumir uma autonomia crítica e legítima por se valer das mesmas formas, elementos e justificativas para a produção de conhecimento e sua intervenção. Então, uma alternativa seria buscar fundamentação em outras bases epistemológicas, que rompam com aquele modelo e sua forma de produção de conhecimento, para que ela possa florescer e, justificada e legitimamente, se afirmar.

O RC oferece essa possibilidade na medida em que opera com uma lógica transfactual de identificação das estruturas e poderes causais das entidades, bem como dos mecanismos e circunstâncias contextuais que operam somente como tendências em um sistema aberto (onde não necessariamente há uma conjunção constante de eventos para geração de leis científicas. De fato, esta situação parece ser apenas um caso limite dentro de uma lógica transfactual em sistemas abertos).

Uma implicação direta para as ciências sociais é que «[...] enquanto os poderes causais básicos e leis do mundo natural tem sido constantes desde a formação do universo, o mundo social exibe poucas constantes e correspondentemente maior variação em propriedades emergentes reais através do tempo e do espaço146». Assim, os cientistas sociais precisam considerar a especificidade histórica e a espacialidade das formas sociais além da transformação de suas propriedades sociais. De particular importância para pesquisa é a preocupação com a distintividade e particularidade de eventos ou processos, que serão engajados e raciocínios contrafactuais probabilísticos aplicados a condições internas e externas do fenômeno em questão.

Resumen

Estatuto epistemológico de la investigación-acción: una relectura a partir del realismo crítico

La literatura sobre investigación-acción/IA enfatiza su papel, simultáneo, de producción de conocimiento e intervención social. Sin embargo, dos críticas le han sido tradicionalmente imputadas: la de que no sería una estrategia científica de producción del conocimiento, debido a la falta de objetividad derivada de la disociación valor-hecho / teoría-práctica; y su incapacidad de generar generalizaciones, ya que el conocimiento producido sería social y subjetivamente contextualizado. Se argumenta, sin embargo, que con y a partir del realismo crítico/RC, tales problemas podrían ser mitigados si parte de los elementos centrales de ese abordaje se reubican y son erigidos sobre las bases del RC. Este artículo realiza entonces una reflexión epistemológica acerca de la IA, discutiendo los principales obstáculos para la diseminación y el uso de esta estrategia, considerando: su estatuto epistemológico, sus características distintivas y su capacidad de generalización. Como conclusión, se señalan algunos de los principales puntos por los cuales una inflexión de la IA vía el RC debería darse, así como algunas implicaciones de esa «actualización» paradigmática.

Palabras clave: Investigación-acción, epistemología, realismo crítico, intervención social.

Abstract

Action research epistemological statute: revisiting it from a critical realism perspective

The literature on action research (AR) argues for its dual capacity of generating knowledge and social intervention. Nevertheless, there has traditionally been a twofold criticism of this approach: first, its not being a scientific strategy of knowledge generation due to its lack of objectivity arising from a dissociation between fact-value / theory-practice; and second, its incapability of producing generalizations since the generated knowledge is both socially and subjectively contextualized. It has been argued, however, that these shortcomings could be offset if critical realism (CR) is used as the foundation of some of the main elements of the approach. Thus, this article offers, first, an epistemological reflection on AR, discussing the main hurdles that prevent the dissemination and use of this strategy. This discussion focuses on its epistemological statute, its distinguishing features, and its potential for generalization. The conclusion points out some of the main reasons why CR should be used in the application of AR, as well as some implications of this paradigmatic “update.”

Key words: Action research, epistemology, critical realism, social intervention.

Résumé

Statut épistémologique de la recherche-action: une relecture à partir du réalisme critique

La littérature sur la recherche-action (RA) met l’accent sur son rôle de production de connaissances et d’intervention sociale. Cependant, traditionnellement elle a reçu deux critiques, la première qu’elle n’est pas une stratégie scientifique de production des connaissances à cause du manque d’objectivité dérivée de la dissociation valeur-fait / théorie-pratique. La deuxième, dû à son incapacité de faire des généralisations parce que les connaissances produites sont sociales et subjectivement contextualisées. Néanmoins, travailler avec et à partir du réalisme critique (RC) est présenté comme un argument qui explique que ces problèmes peuvent être atténués si une partie des éléments fondamentaux de cette approche se situent et s’érigent sur les bases du RC. Cet article fait une réflexion épistémologique au sujet de la RA en discutant les principaux obstacles pour la diffusion et utilisation de cette stratégie, et en considérant son statut épistémologique, ses caractéristiques distinctives et sa capacité pour généraliser. Pour conclure, certains points essentiels sont signalés pour qu’une inflexion de la RA par le biais du RC se donne ainsi que quelques implications de cette «mise au jour» paradigmatique.

Mots-clés: Recherche-action, épistémologie, réalisme critique, intervention social.

Referências

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102. Para realizar sua análise, o autor recorre à troca de correspondências entre os maiores expoentes da pesquisa experimental no campo social da época, Lippitt e Collier, que fundaram as bases para o que hoje é considerado pesquisa-ação. Na análise das correspondências, além de levantar e fornecer o background histórico do contexto em que se inseriu a troca de correspondências, Cooke (2006) também relata uma curta biografia de cada autor, nas quais se mostram as experiências profissionais e as influências pessoais de cada um deles, que marcaram seus posicionamentos científicos [cf. Cooke, B. «The Cold War origin of action research as managerialist cooptation». Human Relations 59 (may 2006): 665-693].

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107. Domingues, I. Epistemologia das ciências humanas, Tomo 1: Positivismo e Hermenêutica, Durkheim e Weber (São Paulo: Edições Loyola, 2004), 672.

108. Gustavsen, B., «Action Research, practical challenges and the formation of theory», Action Research 6, n.° 4 (2008): 421-437.

109. Cooke, B., «The Cold War origin of action research as managerialist cooptation», Human Relations 59 (may 2006): 665-693.

110. Cassell, C. e Johnson, P., «Action research: Explaining the diversity», Human Relations 59 (jun. 2006): 783-814.

111. Ibíd.

112. Ibíd.

113. Cassell, C. e Johnson, P., «Action research: Explaining the diversity», Human Relations 59 (jun. 2006): 783-814.

114. Oquist, P., «The Epistemology of Action Research», Acta Sociologica, 21, n.° 2 (April 1978): 143-163, https://doi.org/10.1177/000169937802100404

115. Ibíd.

116. Ibíd.

117. Olav, E., «From epistemology to gnoseology –understanding the knowledge claims of action research», Management Research News 30, n.° 5 (2007): 344-358, doi.org/10.1108/01409170710746346.

118. Oquist, P., «The Epistemology of Action Research», Acta Sociologica, 21, n.° 2 (April 1978): 143-163, https://doi.org/10.1177/000169937802100404

119. Fazendo coro a proposta de Jessop (2005), optou-se aqui por sistematizar o núcleo duro do movimento, em sua ‘versão tradicional’, a fim de se evitar disparidades ou desvios introduzidos por abordagens específicas. Portanto, nos ateremos aqui às principais ideias da 1ª fase do RC em virtude do relativo consenso existente dentro do movimento sobre tais teses [Jessop, B. «Critical Realism and the Strategic-Relational Approach». New Formantions 56 (2005): 40-53].

120. Vandenberghe, F., «Une ontologie realiste pour la sociologie: système, morphogenèse et collectifs», Social Science Information 46, n.° 3 (2007): 487-542.

121. Bhaskar, R., Reclaiming Reality: a critical introduction to contemporary philosophy (London/New York: Verso, 1989).

122. Jessop, B., «Critical Realism and the Strategic-Relational Approach», New Formantions 56 (2005): 40-53.

123. Fleetwood, S., «Ontology in organization and management studies: a critical realist perspective», Organization 12, n.° 2, (2005): 197-222.

124. Ibíd.

125. Jessop, B., «Critical Realism and the Strategic-Relational Approach», New Formantions 56 (2005): 40-53.

126. Bhaskar, R. R., The Possibility of Naturalism: a philosophical critique of the contemporary human sciences, 3rd Ed. (Routledge: London/New York, 1998[1979]).

127. Para uma interpretação diferente da realizada aqui, cf. Houston, S. (2010) [Houston, S. «Prising Open the Black Box: Critical Realism». Action Research and Social Work. Qualitative Social Work 9, n. 1 (2010): 73-91]. Vale a pena notar que dentre as centenas de milhares de trabalhos disponíveis no banco de dados «Periódicos Capes», com acesso a base de dados internacionais, financiado pelo governo Brasileiro, os artigos dedicados ao tema action research e critical realism são raríssimos, sendo este supracitado uma das exceções. Tal fato reforça ainda mais a suposta originalidade do presente trabalho.

128. Oquist, P., «The Epistemology of Action Research», Acta Sociologica, 21, n.° 2 (April 1978): 143-163, doi.org/10.1177/000169937802100404

129. Bhaskar, R. R., A Realist Theory of Science (New York: Routledge /Taylor & Francis e-Library, 2008 [1975]), 310.

130. Ibíd, The Possibility of...

131. Jessop, B., «Critical Realism and the Strategic-Relational Approach», New Formantions 56 (2005): 40-53.

132. Ibíd, 43, itálicos no original, tradução livre.

133. Ibíd.

134. Ibíd, A Realist Theory...

135. Ibíd.

136. Archer, M., Bhaskar, R., Collier, A., Lawson, T. e Norrie, A, Critical Realism: Essential Readings, Critical Realism: Interventions (New York: Routledge, 1998), 212-13.

137. Ibíd, 47.

138. Jessop, B., «Critical Realism and the Strategic-Relational Approach», New Formations 56 (2005): 40-53, 47.

139. Ibíd.

140. Esta crítica se estende a Latour, que, segundo Vandenberghe (2014b), visa justamente humanizar a natureza e naturalizar os humanos (cf. Vandenberghe, F. What´s Critical about Critical Realism? Essays in Reconstructive Social Theory. Londres: Routledge, 2014b.

141. Essa crítica é feita pelo movimento realista crítico, em geral. Para conferir as particularidades e as nuances dos argumentos, veja: Bhaskar, no âmbito da filosofia da ciência; Archer, no âmbito da sociologia; Fleetwood, no âmbito das organizações, etc. Mas, fora do RC ela também está presente. Para conferir, por exemplo, uma crítica não realista crítica às abordagens pós-modernas, veja Castañon, G. A. «Construtivismo e ciências humanas». Ciências e cognição, vol. 5, s/n (jun. 2005): 36-49.

142. REED, M. Reflections on the ‘Realist Turn’ in Organization and Management Studies, Journal of Management Studies, v. 42, n.º 8, december, 2005.

143. Apesar de Vandenberghe (2014b) afirmar que o pós-modernismo traz em seu seio uma leitura politicamente democrática, ao reconhecer e estimular a proliferação de vozes que emitem suas opiniões (ou produzem discursos) a respeito de qualquer assunto, o que em tese conferiria um «ar» democrático a este movimento; na prática, observa-se uma falha deste argumento visto que, reconhecidamente dentro desta visão (cf. Laclau, E. e Mouffe, C. Hegemonia y estrategia socialista: hacia una radicalizacion de la democracia. Madrid: Siglo XXI, 1987), os discursos têm pesos diferentes e enredam uns aos outros em movimentos rumo a uma hegemonia. Assim, há um sofisma por trás desse raciocínio, em que a questão da suposta democratização das vozes não se resolve pelo simples reconhecimento da diversidade e diferença. Estas não apagam as relações de poder nem a ordem dos discursos.

144. Bhaskar, R. R., A Realist Theory of Science (New York: Routledge / Taylor & Francis e-Library, 2008 [1975]), 310.

145. Ibíd, The Possibility of Naturalism...

146. Ibíd, «Critical Realism and...

Quadro 1

Síntese comparativa entre tradições filosóficas e categorias do conhecimento científico

Categorias/ Tradições

Produção do conhecimento

Justificação do conhecimento

Relação teoria e prática

Relação ideologia e ciência

Implicações para a pesquisa-ação

Categorias / Tradições

Produção do

conhecimento

Justificação do

conhecimento

Relação teoria

e prática

Relação ideologia

e ciência

Implicações para

a pesquisa-ação

Empirismo

Homem produz o conhecimento pelo contato direto e pela observação da realidade.

Demonstrada pela correspondência com a realidade.

Não-relacionadas, prática vem da rigorosa observação da natureza e é tudo o que se precisa para gerar conhecimento. Os fatos falam por si mesmos.

Ciência deveria ser livre de valores e baseada em critérios de observação neutra da realidade. Qualquer tentativa de interpretação é uma projeção do homem sobre a natureza, e por isso, valorativa.

Pesquisa-ação seria tão somente uma prática política, religiosa, social, cultural ou uma atividade educacional, sem relação com pesquisa científica.

Positivismo Lógico

Começa com a formulação de hipóteses, que pode ser concebida com base na teoria ou na realidade. O teste de hipótese se dá pela confrontação entre teoria e realidade. Realidade consiste em fatos e eventos que são identificadas com conceitos. Ela é definida pelo quadro teórico.

O material teórico é avaliado pelo modo de explicação. Pode existir diferentes teorias para o mesmo. Critério de justificação é o método. A possibilidade de diferentes padrões metodológicos produz uma das duas fontes de relativismo o positivismo lógico

É a segunda fonte de relativismo no positivismo lógico. Baseia a produção do conhecimento na observação. Esta permite a eliminação do absurdo manifesto, mas o refinamento da explicação vem pelo teste de hipótese. A prática de observação é informada pela teoria e esta é informada por uma observação a priori. Realidade é diferente da teoria.

Teoria contem valores, mas somente aqueles implícitos ao método científico em si mesmo e que não atrapalham a definição científica de objetividade do positivismo lógico. Valores não devem influenciar o processo científico. Exceto quando a realidade é transformada no processo de produção da ciência (pesquisa experimental).

Situação experimental corresponde exclusivamente aos interesses da ciência (produção de conhecimento) e não aos interesses práticos (porém, a produção de conhecimento pode trazer benefícios práticos). A pesquisa-ação se baseia na reprodução neutra do sistema onde está inserida, pois a mudança social (ex. de valores) não é científica.

Estruturalismo

O conhecimento é produzido pela transformação do conhecimento abstrato material no seu estado bruto em produto de conhecimento concreto e acabado, pelo modo de produção do conhecimento.

O critério de justificação é o método. Não é o produto final que caracteriza e classifica a reflexão, mas, mais do que isso, é o modo ou o método de reflexão.

A relação entre teoria e prática opera em 2 níveis: 1º há uma distinção entre conhecimento e realidade, que formam dois domínios separados. A unidade entre teoria e prática ocorre dentro da prática teórica, produção do conhecimento que ocorre inteiramente dentro do pensamento. A noção dicotômica entre teoria e prática é considerada um mito. Não há teoria pura, visão absoluta, nem há totalmente prática material (concreta). Não há prática no geral, mas práticas específicas, que são distinguidas pelo seu modo de produção com o qual transformam seus objetos

Ciência é livre de valores, exceto os seus próprios valores internos. Ideologia é a antítese da ciência. Ciência tem sua própria prática teórica que é independente de teorias e práticas de outras atividades humanas.

Teoria e prática científica são livres de todos valores, exceto os da ciência em si mesma, e inteiramente livre de ideologia. Pesquisa-ação confunde prática teórica e prática real, os objetos do conhecimento e os objetos reais. Ciência pode ser usada na prática, mas tem que haver independência do processo de conhecimento científico.

Pragmatismo

Produção do conhecimento começa com problemas práticos. A ciência é uma atividade. Ela é um modo direcionado de realização de coisas práticas. Para conhecer alguma coisa é preciso mudá-la. O homem científico, utilizando procedimentos experimentais está interessado em conhecer precisamente que mudanças ocorrem em um dado fenômeno. As ideias que guiam a ação precisam ser traduzidas em operações concretas.

A ideia efetiva consiste em operar objetos. Ideias que não são suscetíveis de operacionalização não são potencialmente capazes de justificação e, assim, jazem fora do escopo da ciência. A justificação do conhecimento é julgada pelas consequências de uma operação. Se a ação preenche as predições da ideia diretiva, maximiza os valores apropriados e resolve a situação problemática que suscitou a pesquisa, então o conhecimento é justificado.

O principal objetivo é a resolução de problemas práticos. O conhecimento não é um fim em si mesmo. A relação entre teoria e prática é produzida pela prática experimental.

Ciência é uma atividade propositiva e assim os valores são parte e parcela da pesquisa científica. Valores guiam a ação e pode haver conhecimento sem ação. Valores não são condições internas pessoais, mas antes critérios para o julgamento de relações externas. Valores e fatos têm a mesma base e são produzidos pelos mesmos procedimentos, embora funcionem diferentemente. Valores e ciência são parte de uma mesma totalidade. Valores, assim como conhecimento, são somente possíveis na união de teoria e prática.

Pesquisa-ação é uma pesquisa científica dentro do pragmatismo. Ela corresponde a visão pragmática de como o homem produz e justifica o conhecimento, o qual é voltado para as posições pragmáticas com foco na união de teoria e prática e o lugar dos valores e da ideologia no processo de produção do conhecimento.

Materialismo Dialético

Sustenta que não há nem sujeitos nem objetos estáticos na realidade, mas sim a práxis, a união dialética da prática baseada nos sentidos, e de uma inteligência humana comprometida com a atividade social criadora, seletiva e crítica. A produção do conhecimento não é vista de uma maneira abstrata, ou lógica, mas sim como um assunto sócio histórico. A questão então transforma-se em; qual é o processo por meio do qual o homem produz conhecimento? Qual tem sido a evolução dos processos e estruturas relacionados à produção do conhecimento? Esta produção do conhecimento, assim como qualquer outro problema deve ser abordado com relação a contextos históricos e sociais específicos.

A justificação do conhecimento é possível no materialismo histórico-dialético por referência a práxis social concreta. Ela se baseia na utilidade social, ou seja, na solução de problemas de grupos sociais específicos, em conjunturas históricas determinadas. Tal justificação, não é, no entanto, um fato estático; mas sim um processo contínuo, que tem que ser continuamente ajustado pela práxis, com o fim de criar e manter resultados desejados dada a sua natureza dinâmica dos objetos de estudo e dos fatores que condicionam seu resultado. Assim como a realidade é dinâmica, o conhecimento também deve sê-lo.

A relação entre teoria e prática é de união dialética da práxis. As únicas teorias relevantes para o processo de produção o conhecimento são aquelas que guiam a prática, e que além disso tem a capacidade de gerar resultados desejados. A prática, por sua vez, deve estar guiada pela teoria. A ação por si mesma não tem valor, sem a consciência que permite aos seres humanos atuarem intencionalmente, em relação ao seu meio físico e social. A ação sem pensamento carece de significado. Em síntese, a prática, a interação humana, baseada nos sentidos, com o ambiente natural e social, é necessariamente intencional e, portanto, guiada pela teoria, pela inteligência ativa e criadora do homem. Assim, teoria e prática se relacionam dialeticamente.

A relação entre valores e ideologias com a ciência, é de que os valores formam parte da ciência, como também em qualquer outra atividade humana. A ideologia e a ciência são ambas formas de produção de conhecimento que diferem em grau – não em espécie - com referencia à explicitação, rigorosidade, sistematização e coerência, no tocante ao processo de produção de conhecimento. As diferencias entre senso comum, ideologia e ciência são puramente quantitativas. O senso comum e a ciência formam polos (da menor para a maior intensidade, respectivamente) de um continuum, em termos de referência à explicitação, rigorosidade, sistematização e coerência; ocupando a ideologia uma posição intermediária.

Para satisfazer os requisitos epistemológicos do materialismo histórico-dialético, a pesquisa-ação deve estar ligada a estruturas e processos sociais específicos. A natureza social do conhecimento humano e a referência de questões teóricas à prática, são posições que forma a pera angular do materialismo histórico com relação a pesquisa-ação.

Realismo Crítico

A tarefa aqui consiste em estudar a estrutura intrínseca dos objetos reais (independente da sua forma de manifestação na realidade; a) materialmente real; idealmente real; socialmente real; ou artefatualmente real), com vistas a identificar seus poderes causais, os mecanismos gerativos, e as condições de emergência, manifestação e de reprodução (duração) do exercício daquelas tendências exercidas pelos poderes causais de cada coisa (objeto) da realidade. O papel chave desempenhado pelas atividades científicas está na redescrição e aplicação transfactual do conhecimento – sendo ambas estritamente incompatíveis com o relato humeniano.

A justificação se dá pela adequação de plausibilibilidade explicativa entre as estruturas gerativas, os mecanismos e as tendências exercidas. Tal justificação recorre a um tipo de raciocínio retroductivo – cuja lógica visa reconstituir a trajetória de formação de uma entidade a partir de seu estágio atual, em direção ao passado, se valendo de questões como, por exemplo: Como teria que ser X para que se tornem objetos de conhecimento para nós? Que propriedades teriam o objeto X para que ele se tornasse objeto de conhecimento para nós (fosse possível ser conhecido)? Não se requer uma técnica específica para sua aplicação. Ao contrário, pode recorrer à “[...] experimentação, medição, observação, etc. sendo estes procedimentos sempre contingentes, falíveis e, talvez, corrigíveis” (idem). Por esta razão o RC abraça o relativismo epistemológico.

O conhecimento científico é apenas mais um tipo de conhecimento. O Modelo Transformacional da Ação Social (TMSA) de Bhaskar de modo similar a Giddens, na esteira do relato da estruturação, compreendendo níveis de intensidade de manifestação dos poderes causais na realidade. Tal modelo explicativo da sociedade – aqui entendida como: “[...]um conjunto de estruturas, práticas e convenções com suas próprias propriedades emergentes e seus efeitos materiais; mas, estas propriedades e efeitos distintivos não são permanentes e sua reprodução (ou transformação) requer o desempenho de práticas apropriadas” (JESSOP, 2005, p.47). - visa a emancipação social. Porém, ele trata do problema diferindo em termos ontológicos entre sociedade e pessoa. Assim como Archer, procede no foco da mediação contingencial por meio de práticas específicas que são capacitadas, assim como constrangidas, pelas posições sociais que pessoas enquanto agentes ocupam.

Propondo que sejam adotadas como unidade de análise as relações entre os objetos – tanto para as ciências naturais quanto para as ciências sociais. Da combinação de tais relações (ou interações) é que emergiriam os poderes causais, levando assim a manifestação de um dado fenômeno. Os objetos do conhecimento científico, embora existam intransitivamente, são interdependentes do conhecimento do qual eles são os objetos. Isso leva imediatamente à diferença crítica, que se torna uma ruptura, por meio do conceito de crítica explicativa, do padrão distintivo fato/valor e teoria/prática. Bhaskar distingue explicações teóricas e práticas. Explicação teórica envolve a detecção do real, estruturas subjacentes e os mecanismos que geram fenômenos observáveis em um processo de três camadas, com um nível humeano relativo ao reconhecimento de regularidades, um nível lockeano relativo à conceituação de estrutura causal, e um nível de leibniziano referente à detecção empírica de estrutura real. Explicação prática envolve o exame de uma conjuntura complexa e sua análise em estruturas componentes e mecanismos (já detectados pela explicação teórica) (IRWIN, 1997).

Para satisfazer os requisitos epistemológicos do realismo crítico, a pesquisa-ação deve estar ligada aos condicionamentos estruturais ontológicos (espaço-tempo), aos mecanismos gerativos contextuais e suas formas de manifestação fenomênicas, bem como nas manifestações empíricas mais visíveis. A busca teleológica pela emancipação requer deste tipo de estratégia a melhoria do sistema social analisado de forma mais ampla, mitigando assim usos puramente instrumentais e/ou cooptativos.

Fonte: Elaboração própria, com acréscimo da tradição do Realismo Crítico, a partir do trabalho seminal de Oquist 1978, 145-159.